Proteína para que te quero: a relação entre ingestão proteica, força e massa muscular

Ingestão adequada de proteínas é fundamental para manter força, massa muscular e prevenir sarcopenia, alertam médicos.

Por Dr. Marcus Quaresma e Dr. Raphael Einsfeld em 9 de setembro, 2025

Idosos desfrutando de uma refeição saudável com alto teor de proteína, ideal para manutenção da massa muscular na terceira idade
Imagem gerada por Inteligência Artificial

A associação entre a ingestão de proteínas, força e massa muscular é amplamente reconhecida na literatura científica e merece atenção especial, sobretudo em virtude das evidências mais recentes que reforçam a importância da ingestão proteica adequada, especialmente entre praticantes de treinamento de força e pessoas idosas.

Inicialmente, é relevante destacar que diversas adaptações musculares ocorrem em resposta ao treinamento de força – comumente denominado musculação – considerado o principal estímulo para a manutenção e o aumento da massa muscular. Esse tipo de exercício, quando prescrito adequadamente por profissional habilitado, promove o aumento da taxa de síntese proteica muscular por até 48 horas, além de intensificar a sensibilidade do músculo esquelético aos aminoácidos por até 24 horas. Em outras palavras, o treinamento de força condiciona o músculo a captar e utilizar aminoácidos, que são derivados da ingestão de proteína, de maneira mais eficiente, favorecendo processos de recuperação e hipertrofia.

Diante disso, surgem três questões essenciais:
(1) Qual a ingestão proteica diária recomendada?
(2) Como essa ingestão deve ser distribuída?
(3) Qual a melhor fonte de proteína?

As recomendações de ingestão proteica para adultos e pessoas idosas sedentárias variam entre 0,6 e 1,0 g/kg/dia, dependendo de condições clínicas específicas. Contudo, em indivíduos fisicamente ativos, particularmente aqueles que praticam exercícios de força, essas necessidades são aumentadas. Para adultos fisicamente ativos, recomenda-se uma ingestão entre 1,6 e 2,2 g/kg/dia, enquanto para pessoas idosas os valores recomendados oscilam entre 1,2 e 1,6 g/kg/dia.

Entretanto, além da quantidade total, a distribuição da ingestão proteica ao longo do dia é um fator determinante para a otimização da síntese proteica muscular. Evidências sugerem que adultos jovens atingem um estímulo máximo de síntese proteica com doses de aproximadamente 0,2 a 0,3 g/kg de proteína por refeição. No entanto, pessoas idosas apresentam um fenômeno conhecido como resistência anabólica, caracterizado por uma menor eficiência na captação e utilização de aminoácidos pelo músculo esquelético. Por essa razão, recomenda-se uma ingestão proteica por refeição de, no mínimo, 0,4 g/kg nesse grupo etário.

Adicionalmente, o envelhecimento é frequentemente acompanhado por um quadro denominado anorexia do envelhecimento, uma condição multifatorial que envolve alterações fisiológicas, bioquímicas, sociais e ambientais, e que resulta na redução da ingestão calórica total, incluindo proteínas. Essa menor ingestão compromete o estímulo anabólico muscular, dificultando a manutenção e o aumento da massa muscular, e favorecendo o desenvolvimento de sarcopenia – condição musculoesquelética caracterizada pela redução progressiva de massa, força e função muscular.

A sarcopenia ou perda muscular, é uma das síndromes mais estudadas no contexto do envelhecimento por estar associada à incapacidade funcional, aumento da dependência e maior risco de mortalidade. Sua prevenção e tratamento baseiam-se principalmente no consumo adequado de proteínas e na prática regular de exercício físico, com destaque para o treinamento de força.

Outro aspecto relevante refere-se à qualidade e origem da proteína dietética. Tradicionalmente, as proteínas de origem animal são consideradas mais eficientes para a manutenção e o aumento da massa e força musculares devido ao seu alto valor biológico e perfil de aminoácidos essenciais. No entanto, recomenda-se priorizar fontes magras, com baixo teor de gorduras saturadas, como o patinho, filet mignon e maminha.

As proteínas de origem vegetal, por sua vez, têm recebido crescente atenção por apresentarem fibras e compostos bioativos com propriedades anti-inflamatórias e antioxidantes. Apesar desses benefícios, suas fibras podem reduzir o apetite – o que é particularmente preocupante frente à anorexia do envelhecimento – e sua maior proporção de carboidratos pode representar um desafio para pessoas idosas com distúrbios metabólicos, como resistência à insulina, diabetes tipo 2, hipertrigliceridemia e obesidade. A Tabela 1 apresenta fontes proteicas de origem animal isoladas e de origem vegetal combinadas, tendo como alvo 20 g de proteína por refeição:

Tabela 1 | Porções alimentares equivalentes a 20g de proteína: comparação entre fontes animais e vegetais com arroz integral.

Alimento / CombinaçãoQuantidade aproximada para 20 g de proteínaOrigem
Peito de frango grelhado (sem pele)65.8 gAnimal
Carne bovina magra cozida71.9 gAnimal
Ovo de galinha (cozido)192.3 g (3 – 4 unidades)Animal
Filé de peixe (tilápia, grelhado)111.1 gAnimal
Leite de vaca integral851.1 mLAnimal
Queijo minas frescal125.8 gAnimal
Feijão carioca cozido + arroz integral (120 g)360.7 g + 120 g de arrozVegetal (combinada)
Lentilha cozida + arroz integral (120 g)238.6 g + 120 g de arrozVegetal (combinada)
Grão-de-bico cozido + arroz integral (120 g)223.2 g + 120 g de arrozVegetal (combinada)
Soja cozida + arroz integral (120 g)101.9 g + 120 g de arrozVegetal (combinada)
Tofu firme cozido + arroz integral (120 g)256.3 g + 120 g de arrozVegetal (combinada)
Fonte: Tabela Brasileira de Composição dos Alimentos (TBCA)

É claro que essa combinação é simplista e não traduz um prato necessariamente real, que será composto por outros vegetais e outras fontes alimentares que facilitarão atingir o alvo proteico diário; porém, revela a disparidade para proteína considerando as diferentes fontes proteicas. Logo, vegetarianos precisam se atentar às quantidades adequadas, procurando um profissional habilitado (Nutricionista).

 Dessa forma, a adoção de uma dieta mista, que combine fontes proteicas animais e vegetais, parece ser a estratégia mais adequada para preservar a saúde muscular em pessoas idosas. As proteínas animais, especialmente a carne vermelha magra, fornecem nutrientes críticos como ferro, enquanto as proteínas vegetais contribuem para a saúde da microbiota intestinal e controle glicêmico. A combinação equilibrada de ambas permite aliar qualidade nutricional, segurança metabólica e sustentabilidade funcional.

Referências

Morton RW, Murphy KT, McKellar SR, et al. A systematic review, meta-analysis and meta-regression of the effect of protein supplementation on resistance training-induced gains in muscle mass and strength in healthy adults [published correction appears in Br J Sports Med. 2020 Oct;54(19):e7. doi: 10.1136/bjsports-2017-097608corr1.]. Br J Sports Med. 2018;52(6):376-384. doi:10.1136/bjsports-2017-097608

Nunes EA, Colenso-Semple L, McKellar SR, et al. Systematic review and meta-analysis of protein intake to support muscle mass and function in healthy adults. J Cachexia Sarcopenia Muscle. 2022;13(2):795-810. doi:10.1002/jcsm.12922

Tabela Brasileira de Composição de Alimentos (TBCA). Universidade de São Paulo (USP). Food Research Center (FoRC). Versão 7.2. São Paulo, 2023.

Dr. Marcus Quaresma

Possui graduação em Nutrição pelo Centro Universitário São Camilo (2013), atuou como estagiário no Centro de Estudos em Psicobiologia e Exercício (CEPE) no ano de 2013, foi aluno de treinamento técnico (TT3) na Universidade Federal de São Paulo no ano de 2014; Especializado em Fisiologia do Exercício Aplicada à Clínica (UNIFESP-BS) (2015) e Nutrição Esportiva: Bases fisiológicas, bioquímicas e moleculares (FAPES-SP) (2016). Especialista em Nutrição Esportiva pela Associação Brasileira de Nutrição (ASBRAN). Mestre em Ciências pela Universidade Federal de São Paulo (2017), Doutor em Ciências pela Universidade de São Paulo (2018 - 2022) e Membro do Grupo de Estudos em Nutrição, Atividade Física e Processos de Envelhecimento (NAFE-USP). Docente do curso de Nutrição e Medicina do Centro Universitário São Camilo. Foi nutricionista Clínico no Ambulatório de Nutrição do Setor de Lípides, Aterosclerose e Biologia Vascular (2014 - 2018). Atualmente é nutricionista esportivo do clube de atletismo Orcampi (2017 - Atual) e do Instituto Vanderlei Cordeiro de Lima (IVCL; 2020 - Atual). É coordenador científico da Associação Brasileira de Nutrição Esportiva (2014 - Atual). Na graduação ministra as disciplinas de Biomoléculas, Nutrição Esportiva, Determinantes Nutricionais no Envelhecimento e Nutrição Baseada em Evidências. É membro do Laboratório de Exercício e Qualidade de Vida cuja linha de pesquisa é direcionada para a avaliação de parâmetros nutricionais e a sua relação com desfechos em saúde, especialmente, a sarcopenia, a síndrome da deficiência de energia relativa ao esporte e o sono. Além disso, estuda o efeito de intervenções para modificar a composição corporal e o desempenho físico.

Dr. Raphael Einsfeld

Raphael Einsfeld (MD, MBA, MSc, PhD) Coordenador da Medicina do Centro Universitário São Camilo de São Paulo, Doutorado em neurociências pela UNIFESP, MBA em Gestão em Saúde pela FGV, Professor de Economia da Saúde pela FGV, Professor Titular da Disciplina de Emergência – Centro Universitário São Camilo, Médico do Esporte pela UNIFESP. Dr. Raphael possui ampla experiência na gestão de serviços em saúde, tendo sido diretor médico de importantes instituições em São Paulo. Atua há mais de 10 anos na área de educação médica e possui linhas de pesquisa em medicina esportiva e educação em saúde. Ampla experiência em consultoria, já tendo participado de processo de transformação de diversos hospitais e universidades.